Múltiplos Sentidos
Como nas cidades, escrever é uma arte que nos oferece múltiplos sentidos. Cabe a nós escolher um...
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Nos cruzamentos, trevos e viadutos do ser, somos guiados diariamente pelo mapa do inconstante. E posso vir a concordar com Jack, e pensar que isso tudo aqui é um grande e estranho sonho... Daykerson, 25 anos, sobrevivendo entre amor, ironias, sonhos e livros.

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Meu padrinho
05 novembro 2011, 7:50 PM

Hoje faz um ano que meu padrinho se foi. Eu estava na faculdade, sentado em um canteiro, segurando os livros para uma colega que havia ido na biblioteca. Era uma sexta-feira, dia 05 de novembro de 2010. Os Julianos estavam em Cascavel para a pós-graduação, e eu fui embora com eles para casa. Pedimos pizza, e eu me sentia extremamente triste. No trabalho, dia seguinte, chorava pelos cantos, e nada tirava uma espécie de culpa de mim.
Em julho desse mesmo ano, eu tinha feito a minha primeira viagem para Minas Gerais, desde a minha mudança, em 2009. Fiquei em Muriaé, e apesar da minha vontade, não consegui ir até Carangola, onde já tinha a idéia fixa de ver meu padrinho. Mas, até aquele momento, não pensei que nada iria me impedir de vê-lo um ou dois anos depois.
Porém, pouco tempo depois, ele foi internado em Muriaé, no Prontocor, com um um problema um tanto sério no coração. Meu pai me ligava diariamente, trazendo notícias. Ele havia passado por uma cirurgia de alto risco, que durou muitas horas. Eu estava aqui, no Paraná, preocupado. Cheguei a ligar para o hospital umas duas vezes para saber notícias.
Um dia, meu pai me ligou, e disse que estava com meu padrinho. Eu perguntei se era possível falar com ele. Alguém que lá estava não recomendou, mas mesmo assim colocaram ele no telefone para falar, imagino eu, uns 2 minutos.
Perguntei a ele como estava, e disse várias coisas para animá-lo. Comentei sobre o Fluminense, nosso time, que estava na liderança do campeonato nacional. E prometi a ele que em 2011 retornaria a Minas e com toda certeza iria até Carangola, onde iríamos fazer uma caminhada pela cidade. Mas essa caminhada nunca aconteceu. Nem o café que prometi que tomaríamos juntos. Tudo ficou pro tempo apagar.
Naquela noite do dia 5, haviam chamadas perdidas do meu pai, fato que sempre me preocupa. Em seguida, minha esposa me ligou, com uma voz triste, dizendo que eu tinha que ligar para meu pai. Logo pensei em algo com minha mãe, e até mesmo perguntei a ela se era. Ela negou, e logo veio a imagem de meu padrinho na cabeça. Aquela voz fraca que ouvi quando conversamos. E perguntei novamente a ela, que ficou calada, deixando o silencio confirmar o pior.
Falei com meu pai, que estava abalado. Afinal, foram décadas trabalhando juntos, sempre comigo, pequenininho, no meio de tudo. Ele disse que estavam se programando para ir a Carangola para o enterro, no sábado. Ele foi junto de minha irmã, e eu fiquei aqui, com minhas angústias, culpas e tristezas.
Hoje, sinto um vazio que nada preenche. Na verdade, fazem doze meses que sinto esse vazio. Acredito que estas foram as primeiras promessas que fiz, e que não haveria forma nenhuma de cumprir. E isso me maltrata.
Meu padrinho nem teve a oportunidade de ver o seu time (e meu) campeão brasileiro de 2010, fato que acredito que fez todo sentido. Esse título teve uma simbologia muito mais forte que um simples campeonato vencido. Tinha a ver com meu padrinho de alguma forma, e eu sei disso. Lembro até hoje da tarde de domingo, do jogo contra o Guarani, quando o Simon apitou o fim de jogo e eu gritei pelo apartamento, e na janela. Eu estava sozinho, e me coloquei a chorar, chorava pelo meu padrinho, chorava de felicidade também. Mas, acredito eu, aquela foi a única vez que tive oportunidade e coragem para desabafar sobre o que eu estava sentindo.
Esse ano de 2011 eu voltei a Minas, assim como prometi a meu padrinho. Levei inclusive minha esposa, pela primeira vez, na minha região. Teria sido perfeito. E, assim como prometido, fui a Carangola. O primeiro lugar que eu queria ir era até a casa de meu padrinho, e assim meu pai me levou. Não havia ninguém lá. Eu me segurava em uma emoção forte, era tudo junto. Passeamos pela cidade e voltamos para Muriaé. Naquele momento, quem eu queria ter visto, não estava ali.
No dia que fui embora de Muriaé, eu chorei bastante dentro do ônibus, onde fui consolado pela Carol. Eu estava de novo deixando tudo para trás, e chorava do mesmo jeito que havia chorado em 2009, e em 2010. Eu estava deixando meu pai, minha mãe, toda a família e problemas, amigos, e, meu padrinho, junto com uma promessa.
Mas, eu sei que o Silas sabe, que eu cumpri a minha promessa. Eu estava lá padrinho. Eu fui caminhar, fui pra gente conversar, falar de futebol. Mas, Deus precisou do senhor primeiro.
Saudades, Silas Ferreira Rodrigues, o “negrinho’, o “Silas da Telemig”.
Onde você estiver, que tenha Deus e toda nossa saudade com você.
A minha primeira perda de alguém próximo. E como dói.
Saudades, padrinho!